sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Manoel Ribeiro do Val

      Gostaria de compartilhar uma interessante história. Procurando material para minha monografia, encontrei o nome de Manoel Ribeiro do Val. Val foi um produtor rural Sulparaibano e a ele é atribuído um dos primeiros capítulos da história ambiental no Brasil. O Lavrador é mencionado principalmente por José Antônio Pádua no Livro "Um sopro de destruição: pensamento político e crítica ambiental no Brasil escravista, 1786-1888".  A seguir transcrevo um pouco do material que encontrei.
           Entre os dias  8 e 12 de julho 1878, foi realizado o Congresso Agrícola, no Rio de Janeiro. O evento reuniu agricultores das principais regiões produtoras de café (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo) a fim de promover a discussão acerca dos problemas relacionados com a agricultura brasileira. Manoel Ribeiro do Val representou Paraíba do Sul neste congresso. 
          O motivo para a realização de um Congresso Agrícola na sede do Império foi encontrar formas de auxiliar a lavoura “do país” e impulsionar seu desenvolvimento. Com intuito de facilitar os trabalhos nos dias do congresso, o governo elaborou um questionário a ser respondido previamente pelos representantes. Pádua (1998) ressalta que a terceira pergunta deste questionário relacionava-se com medidas para melhorar a lavoura e com as mudanças técnicas e administrativas que nela deveriam ser introduzidas. O fato é que a produção dos cafezais já não era a mesma, aliada ao envelhecimento da mão de obra escrava, o desgaste dos solos e a falta de lugares virgens (matas) a explorar indiciavam o declínio da produção cafeeira no vale do Paraíba.
           Através dos transcritos do Congresso Agrícola de 1878, é  possível observar em algumas falas que os problemas com o plantio e o cultivo do café já se faziam sentir há muito.

“Alguns culpavam (pelos tempos difíceis que estavam vivendo) a escassez de mão-de obra escrava; outros, a incapacidade de utilização de modernos equipamentos de processamento de café; e outros, ainda, a falta de crédito agrícola a juros baixos. Em meio às lágrimas, que variavam da autocrítica ao desespero, apenas algumas vozes chamaram a atenção dos fazendeiros de Vassouras, assim como dos municípios vizinhos, sobre o estado decadente das terras e dos cafezais”.
          As praticas rudimentares começavam ser discutidas neste momento. No entanto, os problemas com a mão de obra e capitais ofuscaram significativamente as questões técnicas e produtivas (PÁDUA, 1998). Muitos dos representantes que ali estavam ainda tinham a concepção de que, resolvidos os problemas com mão de obra e as questões financeiras, a produção voltaria ser a mesma dos velhos tempos.
        Diante deste contexto, Pádua (1998)  e LIMA (2011) destacam o discurso proferido no congresso por Manoel Ribeiro do Val, o qual  apresentou-se como um lavrador de Paraíba do Sul.  Segundo Val, destoando abertamente dos outros participantes, era um "erro grave e imenso supor-se que a deficiência da nossa produção é proveniente unicamente da falta de braços e capitais. Só quem não pensa e estuda, só quem não acompanha e examina atentamente e de perto o nosso sistema de explorar o terreno sem arte e ciência, e a marcha que a lavoura tem seguido, e as revoluções meteorológicas e mudanças climatéricas por que tem passado o Brasil neste último quarto de século, é que pode avançar em absoluto uma semelhante proposição.
A crise da lavoura, aos olhos daquele fazendeiro, era essencialmente ecológica, derivando dos “efeitos negativos da nossa plantação”. A prova disso estava no fato de que “quando nos bons tempos tínhamos chuvas abundantes de princípios de agosto até fins de maio do ano seguinte, intercaladas apenas por um curto veranico, que nunca excedia 15 dias, colhíamos abundantes roças e boas safras de café”. Agora os produtores tinham que se deparar com a irregularidade das estações, a falta de chuvas, o aumento das temporadas de seca, o empobrecimento
            Pondo de lado os mil e um comentários proferidos para justificar o esgotamento do solo, cafeeiros envelhecidos e a produção em declínio ou estacionária, enquanto se consumiam mais e mais reservas de florestas virgens, Manoel Ribeiro do Val, a voz mencionada, terminou o seu discurso para alguns fazendeiros no Congresso Agrícola dizendo: “Apenas aqueles que estudam, plantam, mas que apesar disso não conseguiram  obter um bom resultado nesses últimos 25 anos, podem imaginar os efeitos  negativos do nosso sistema de plantio”.
Para prosseguir produzindo dentro desse contexto, era despendido tempo, esforço  e dinheiro na compra de novas e caras terras, com matas virgens para prepará-las à lavoura — iniciando novo ciclo de impropriedades — cujo retorno só iria ocorrer, no mínimo, seis anos depois do início do plantio. Tais fatores, negativos, foram acrescidos de outros: o alto preço do escravo, após a proibição do tráfego em 1850; pragas que volta e meia atacavam os cafezais; gastos excessivos com luxos, títulos de nobreza e demonstrações de status que permearam a vida dos “barões do café”; concorrência dos cafezais do “Oeste” paulista, que, com maior produtividade e custos mais baixos, aos poucos conquistavam o mercado.

Referências:


PÁDUA, José Augusto. “Cultura esgotadora”: agricultura e destruição ambiental nas últimas décadas do Brasil Império. Estudos Sociedade e Agricultura. Rio de Janeiro: UFRRJ/CPDA, n. 11, p.134-163, outubro, 1998.

SILVA, Viviane Vidal da. Médio Vale do Paraíba do Sul: Fragmentação e Vulnerabilidade dos Remanescentes de Mata Atlântica. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Ciência Ambiental da UFF. Niterói, 2002.

SIMÃO, A. L. Congressos Agrícolas de 1878: um retrato do reformismo ao final do século XIX. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Unicamp. Campinas, 20


MUAZE, M. A. F. O Vale do Paraíba e a dinâmica Imperial. In: LERNER, D.; MISZPUTEN, F. (Orgs).Inventário das Fazendas do Vale do Paraíba Fluminense - fase III. 1ed. Rio de Janeiro: INEPAC/ Instituto Cidade Viva, 2011, v. 3, p. 293-340.

4 comentários:

  1. Manoel Ribeiro do Val, não era só um agricultor ou fazendeiro, naquela época, ele já era formado na Escola de Agricultura, equivalente a ser hoje um Engenheiro Agrônomo.

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  2. Eu li em algum lugar que falava neste discurso de Manuel Ribeiro do Val, em que ele falava na monocultura como um dos fatores de esgotamento do solo. Neste artigo fala mais um pouco sobre isto.
    http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/ar/libros/brasil/cpda/estudos/onze/padua11.htm

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    1. Oi Beth, muito obrigado pelo comentário. Farei a leitura, acho muito interessante as história sobre o Manuel do Val.

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